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quarta-feira, 17 de outubro de 2012



“... por causa da mulher cuxita (etíope)...”.


Releitura do texto de Números 12.1
A mulher cuxita como se lê no livro bíblico de Números é apresentada como natural da região de Cuxe onde se encontra um povo de pele negra. De acordo com Gn 2.13, o rio Gion do jardim do Éden rodeia a terra que se estende até a região atualmente conhecida como África. Existem ainda outras citações bíblicas sobre Cuxe: Em Gn 10.6-9 os cuxitas são descendentes de Cam, filho de Noé; e também no livro de Isaias (45.14), sendo considerado nesse livro como uma nação militar e comercialmente poderosa.
Originária desse povo forte e poderoso, a mulher cuxita é citada na bíblia apenas uma vez e como esposa de um grande líder israelita, que pela segunda vez casa-se com uma estrangeira. Segundo uma lenda judaica, antes de Moisés fugir para o deserto de Midiã, participou de uma campanha egípcia contra Etiópia. A filha do rei etíope teria se apaixonado por ele, o que resultou no casamento de ambos. Trata-se de uma lenda entre histórias românticas, porém interessante para ser lembrada. No entanto a primeira esposa de Moisés é da terra de Mídiã, assim a lenda não é legitimada pelo texto bíblico segundo o qual a mulher etíope foi à segunda esposa.
“Mirian e Arão começaram a criticar Moisés porque ele havia se casado com uma mulher etíope.” (Num. 12.1). No texto sagrado, encontram-se murmurações dos irmão de um líder israelita. Os mesmos apresentaram a ele a causa de tantos problemas ocorridos com o povo, como fome e doenças. A mulher etíope foi acusada de ser o fator responsável pelas adversidades. O que essa mulher pode ter feito ou representado para essas pessoas ao ponto de a acusarem de ser a causa de tantos problemas? Qual a ligação entre a fome, às doenças do povo e aquela mulher? O fato é que precisavam encontrar algum motivo para julgar a liderança de seu irmão Moisés. Em meio às discursões familiares e à busca pelas causas dos problemas do povo, encontra-se uma mulher misteriosamente apresentada nas entrelinhas, nas poucas palavras de alguém que considerou importante mencioná-la.
O fato de ser estrangeira não era suficiente para justificar a acusação, pois a primeira esposa de Moisés também era de outro povo, mas apenas a segunda é citada como pivô da discursão o que confronta uma explicação étnica. Então o que realmente causou aquela desavença? É interessante o fato de que a profetiza Miriã e seu irmão Arão, encontraram na mulher etíope uma ameaça. Talvez muito mais ligada à inveja e competição pela liderança do povo, devido a forte influência espiritual que os acusadores exerciam.
“Será que o Senhor tem falado apenas por meio de Moisés? Perguntaram. Também não tem ele falado por meio de nós?” Eles demonstram no texto um descontentamento com a monopolização do poder dado por Deus a Moisés, é claramente apresentada uma insatisfação e inquietação por serem lideres secundários.
A busca pelo poder durante a peregrinação do povo fez com que os irmãos de Moisés tivessem aversão à sua segunda mulher. No texto Miriã e Arão não falam diretamente das dificuldades como sendo fruto de conselhos ou da influência daquela mulher. Porem suas ações e palavras levam a pensar que essa mulher poderia ser consideravelmente influente na direção da liderança junto com Moisés. É estranho que se relacionem as desgraças meramente com sua etnia ou a inveja dos irmãos de Moisés, ao ler o texto com olhos críticos, nas entrelinhas, os detalhes oferecem algo mais. Assim a presença de personagens como a mulher cuxita aponta para o fato de que junto com o povo israelita, se encontravam outros povos que juntos participariam da busca pela terra prometida, unidos por um só Deus, construindo uma só história e essa questão pode ser também considerada uma das causas da discursão dos irmãos.
“E o Senhor ouviu isso.” As linhas posteriores da história bíblica de acusação, trazem um Deus que com justiça interfere de maneira clara e objetiva falando de seus propósitos para com Moisés e o porquê de seus irmãos estarem errados em seus questionamentos (Num 12.4-9). Assim podemos afirmar que junto com ele estava sua esposa, legitimada por Deus e sem nenhuma culpa.
A mulher etíope é mais uma grande personagem na narrativa bíblica. Uma heroína negra, historicamente resgatada por alguém que não esqueceu de mencioná-la e a registrou num momento importante e decisivo para o povo de Yahweh. Como outras e outros lideres sufocados por interesses políticos e por preconceito e discriminação. É preciso resgatar a memória desses que sofrem, sendo acusados de situações nas quais estão para construir e agregar.

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